É arte, ou não é arte?

Acredito que alguns produtos culturais (fotografia, cinema etc.) já passaram por essa interpelação antes de conseguirem galgar alguns degraus na hierarquia dos objetos humanos. Mesmo instituições artísticas consagradas como o teatro, em algum momento pré-gregolândia tiveram o seu ido de obscuridade. Hoje, porém, ninguém questiona que Hamlet é uma obra de arte.
Seguindo essa lógica, é comum ler sobre os videogames encabeçando o ranking de legitimação no campo das artes: "os jogos eletrônicos representam uma nova forma de arte vívida, tão apropriada para a era digital quanto as mídias anteriores foram para a era das máquinas"[1]. Claro que mesmo sendo uma conjectura do grande connoisseur de medias (corrigindo a tradução precária da folha) do MIT, uma afirmação dessas não desce fácil na goela de qualquer um.

A grande polêmica, neste caso, é que para muitos o videogame nem sequer chegaria à léguas das bordas do campo artístico. Seria algo menor, industrializado (anti-aurático, para usar a terminologia de Walter Benjamin), bem próprio ao consumo rasteiro: isso sem alcançar nem a categoria de kitsch.

Apresentado o problema, reformulo a pergunta: qual o motivo de enquadrar o videogame como arte? Será porque os objetos artísticos "são certas manifestações da atividade humana diante das quais nosso sentimento é admirativo, isto é: nossa cultura possui uma noção que denomina solidamente algumas de suas atividades e as privilegia"[2]?

Entretanto, se essa é a finalidade da questão, não é necessária a justificação do videogame enquanto um dos elementos no campo das artes. Monsieur Mario (o encanador de Shigeru Miyamoto) é cultuado por milhões de pessoas no mundo todo. É um cânone da cultura popular, e em nenhum momento precisou ser exposto numa galeria de arte.

A relação entre videogames e o campo artístico deve ir além destas dicotomias sem propósito. Se for arte ou não arte, em nada contribui para o avanço da disciplina de estudo dos jogos eletrônicos. Devemos nos concentrar, em outro sentido, nas questões que o campo das artes nos apresenta nessa relação. Por exemplo, como as estratégias do Game Design causam efeitos de natureza cognitiva, sensória e emocional no jogador? Ou, o que representa o belo e o feio na experiência do Gameplay?

Enfim, esqueçam essa balela de "é arte, ou não é arte".


[1] JENKINS, Henry. A Arte Emergente. Folha de São Paulo, São Paulo, 14 janeiro, Ilustrada, 2001. p. 2-3

[2] COLI, Jorge. O que é arte. São Paulo: Brasiliense, 2008. p. 8.

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